*Artigo escrito por Marilyn Hahn e publicado originalmente em sua coluna para o Money Times
A Deloitte lançou no fim de 2022 um estudo prevendo que setores como varejo, telecomunicações, entre outros, podem capturar mais de R$ 24 bilhões/ano em receitas em cinco anos, se acoplarem serviços financeiros às suas plataformas.
Esse modelo, chamado de Embedded Finance, consiste na inclusão de produtos como a contratação de um cartão de crédito ou de um seguro em jornadas já existentes desses setores. Tal funcionalidade tende a complementar a oferta de valor, gerando linhas de receita adicionais.
Ao contrário do que se imagina, os bancos não deixam de fazer parte desse movimento. Porém, outros players ganham espaço de destaque nesse mercado.
Alguns exemplos são as fintechs de nicho (insurtechs e credtechs), empresas de banking as a service, provedores de open banking entre outros tantos modelos que provavelmente surgirão com o amadurecimento do setor.
Mas afinal, como funciona o embedded finance na prática? Confira nesta e nos próximos artigos da coluna, uma série sobre os mais diversos modelos de serviços acoplados e de como eles estão transformando a economia e a experiência dos consumidores.
Para se ter uma ideia, entre os exemplos, estão produtos como seguros, crédito, criptomoedas, entre outros. Tudo isso vem ganhando uma nova dinâmica e serão mostrados aqui, na prática.
Neste artigo, falaremos sobre uma das grandes promessas do mercado para 2023, o mercado de seguros.
O que são os seguros acoplados?
Segundo Simon Torrence, entusiasta do tema, o mercado de embedded insurance, ou seguro acoplado, pode gerar cerca de US$ 700 bilhões em prêmios de seguros até 2030. Isso considerando apenas seguros de bens e contra acidentes. Caso os seguros de vida e de saúde entram na conta, o potencial chega a US$ 3 trilhões até essa data.
Embedded insurance é a possibilidade de qualquer empresa do mercado se conectar em ofertas de seguros de empresas especializadas e oferecê-la dentro da jornada de consumo de produtos e serviços. No Brasil, o exemplo mais clássico desse modelo é o “seguro de garantia estendida”, que visa prover ao comprador uma extensão temporal da garantia do fornecedor de linha branca.
Imagine, então, estender esse tipo de oferta no momento da contratação de um empréstimo, na compra de móveis para casa ou mesmo na compra de uma passagem aérea. Que tal um seguro para cobrir eventuais atrasos e permitir facilmente trocar de voo num clique?
Diferentemente do seguro de garantia estendida que estamos acostumados a ver no varejo físico, o Embedded Insurance prevê o acoplamento desse serviço por meio de APIs dentro da jornada de forma transparente, sem Alt-Tab. A mágica consiste em diminuir o tempo entre a contratação de um produto e a do seguro, fazendo com que o consumidor realize o check out já coberto por eventuais adversidades que possam existir.
Por outro lado, a empresa fornecedora também se beneficia: imagine a diminuição de burocracia para reagendar um voo perdido que a companhia aérea teria se o passageiro tivesse contratado o seguro e pudesse fazer a alteração do voo no próprio aplicativo.
Ainda segundo Torrence, o setor de seguros será a nova grande onda do embedded finance. Quem conhece o mercado sabe que a provocação faz todo sentido, já que o modelo pode preencher uma série de gaps que fazem parte de sua oferta, entre eles:
– Altos custos de distribuição: clientes muitas vezes não entendem produtos de seguro, não conseguem ver as vantagens e o economics por trás do negócio e, dessa forma, dificilmente confiam em corretores de seguros. Acoplar a oferta em alguma jornada de compra de uma marca em que ele confia e já está acostumado facilita a distribuição e contratação.
– Pouca informação sobre o cliente: empresas de seguro geralmente possuem pouca informação sobre o seu target market, e esse cenário não muda quando o prospect vira cliente de fato. Em vez de buscar essas informações no mercado, as próprias plataformas podem direcionar o público-alvo dentro da sua base conforme o comportamento do consumo de seus clientes. O Embedded Insurance pode contribuir para o desenvolvimento de ofertas mais customizadas usufruindo de dados em tempo real, barateando o produto.
– Burocracia na contratação: A assimetria de preços entre os players de mercado que existe atualmente deixa os consumidores ainda mais resistentes na contratação de seguros. Ofertas online tornam o processo mais transparente e deslocam a competitividade para o âmbito da experiência. Produtos de seguro são tidos como complicados, inflexíveis, caros e difíceis de entender e os benefícios parecem distantes e incertos. Trazê-los para perto de casos reais, como o exemplo do seguro para eventuais perdas de voo, tangibiliza seu real valor.
Além de todos os fatores, com a aceleração de jornadas cada vez mais digitais, as empresas estão preocupadas em deter o controle da experiência com a marca.
Embedded Finance na prática
Um exemplo é a empresa de seguros chinesa ZhongAn, que oferece a seus clientes seguros acoplados a telefones celulares. Ou seja, se o telefone cai no chão e quebra a tela, sensores são ativados antes mesmo que o dono do telefone pegue o do chão. Um novo telefone é enviado até a casa do cliente sem toda a burocracia de ir até a loja ou falar com o fabricante.
Outro exemplo prático é a insurtech austríaca Bsurance, que vem ganhando bastante espaço com suas soluções de seguros e IoT (Internet of Things, ou internet das coisas). Um dos casos de uso da empresa é desenvolvido de um seguro acoplado à escova de dentes inteligente da Playbrush: com um modelo de subscrição, o usuário da escova paga uma taxa mensal para o seguro, mas ao mesmo tempo tem serviços como profilaxia reembolsados. O objetivo é fazer o usuário escovar mais frequentemente os dentes e cuidar melhor da saúde dentária.
O caso de uso da Bsurance foi feito para a Refurbed, empresa que permite que pessoas adquiram eletrônicos usados a um preço justo, que também é referência de Embedded Insurance. Nesse caso, a Bsurance pegou um seguro da Allianz já existente e o digitalizou totalmente, fazendo com que fosse possível acoplar o mesmo ao processo de compra. O processo de gerenciamento do seguro digital é acionado de ponta a ponta da jornada, e o gerenciamento de sinistros é totalmente incorporado à loja online.
Por último, temos a empresa brasileira 180º. Ela desenvolveu com a Loft, plataforma de compra e venda de imóveis, um seguro residencial que traz um pacote de assistência por pontos. Com isso, os clientes têm total flexibilidade para usar os serviços, de acordo com a necessidade.
Esse novo formato de distribuição fortalece o setor em todos os aspectos, principalmente no que diz respeito ao grau de confiança do consumidor, já que ele terá uma experiência completa dentro da plataforma das empresas. Isso faz, cada vez mais, os consumidores escolherem as empresas com que querem interagir pela facilidade, experiência proporcionada, identificação que elas geram com seu público e é claro, o portfólio de produtos oferecidos e sua qualidade.